Poltrona Cabine: Abandonados/Cesar Augusto Mota

Poltrona Cabine: Abandonados/Cesar Augusto Mota

Histórias de sobrevivência e superação sempre garantiram lugar de destaque na sétima arte, ainda mais se inspirados em acontecimentos reais e com filmagens realizadas com realismo e poucos efeitos especiais. “Abandonados” (Abandoned), de John Laing, remete a uma tragédia de 1989 ocorrida em alto mar com um grupo de pessoas que lutaram para sobreviver durante 119 dias.

Quatro homens embarcam em um veleiro que parte da cidade de Picton, na Nova Zelândia, para Tonga, outro país da Oceania. Entretanto, o diário de bordo é drasticamente alterado por uma onda volumosa, que vira o barco de ponta cabeça. Todos tentam se manter vivos à deriva enquanto buscam chegar em terra firme. Na medida em que o tempo passa, os protagonistas passam a enfrentar dificuldades ainda maiores e terão de utilizar todos os recursos disponíveis para escapar com vida.

Um rosto conhecido que está no elenco dessa trama sufocante é Dominic Purcell, que ganhou destaque nos últimos anos na série Prison Break. O ator está acostumado a representar personagens em situações que exigem força física e resiliência, e nesta obra mostrou que sua escalação nessa trama foi uma ótima escolha para o elenco. Os demais atores possuem atuações de destaque e seus personagens mostram que, apesar das diferentes personalidades, conseguem suportar todas as provações.

Um diferencial desse filme é a narração em off, que não fica em perfeita sincronia com o que se passa na tela. Há espaço para a religiosidade na trama, que pode ser um ponto positivo para alguns telespectadores e negativo para outros que possuam outras crenças.  A união do grupo, a criação de laços de amizade e a tentativa de amenização da atmosfera tensa acabam por não se concretizar na narrativa, decepcionando o espectador, que esperava por momentos de descontração e alívio em um cenário deveras desfavorável.

Apesar de bem ritmado e com uma boa estética, o filme apresenta um desfecho que não é dos mais satisfatórios e o último ato da narrativa ocorre de maneira apressada, o que pesa contra uma obra que ilustra superação e resiliência de um grupo em uma situação de risco. Apesar das falhas, é um filme assistível e que mostrou um acontecimento real de maneira fiel, vale a vista.

Cotação: 3,5/5 poltronas.

Por: Cesar Augusto Mota

Poltrona Cabine: No Céu da Pátria Nesse Instante/Cesar Augusto Mota

Poltrona Cabine: No Céu da Pátria Nesse Instante/Cesar Augusto Mota

Obras cinematográficas sobre a história do Brasil vêm atraindo cada vez mais públicos com destaques para o longa-metragem “Real: O Plano por trás da História”, lançado em 2017 e o documentário “Democracia em Vertigem”, que chegou a ser indicado ao Oscar em 2020. “No Céu da Pátria Nesse instante”, de Sandra Kogut, registra mais um importante capítulo em nosso país e que carrega marcas de violência e resistência.

A obra da cineasta carioca ilustra momentos conturbados e de tensão meses antes das eleições de 2022 e que culminaram com a tentativa de golpe de Estado em 08 de janeiro de 2023. Defensores dos candidatos foram motivados pela diretora, instruídos a gravarem com seus celulares uma espécie de diário audiovisual, desde a rotina familiar até os preparativos para o processo eleitoral, como confecção de material e mobilização em prol das respectivas campanhas. Em seguida, são apresentadas imagens da depredação ao Congresso Nacional, Palácio do Planalto e Supremo Tribunal Federal. Logo, é feito um contraponto entre personalidades escolhidas a dedo pela diretora, dentre elas, Marcelo Freixo, atual presidente da Embratur.

A narrativa é linear, mesclada com imagens de arquivo e depoimentos de pessoas que vivenciaram os fatos citados anteriormente e fortes argumentações de Kogut acerca do ocorrido no processo eleitoral e na tentativa de golpe e abolição do Estado democrático de Direito. Apesar de o espectador perceber qual ideologia política a diretora defende, ela não se esqueceu de dar voz aos dois lados, defensores da direita e da esquerda, como manda uma produção que busca fazer o público ficar a par dos fatos e fazer sua própria reflexão.

Além dos embates pré-eleitorais e a tentativa de golpe, o uso de fake news como fator de desinformação e mobilização das massas também foi abordado. Um instrumento perigoso e que foi nocivo a milhões de pessoas foi impulsionado pelo uso das redes sociais com estratégias de alcance pré-estabelecidas. Na medida em que o documentário foi se desenvolvendo, Sandra Kogut foi reinventando as formas de se desenvolver o produto audiovisual e mostrou como o uso das tecnologias, como o uso de programas para reuniões online e a filmagem por celular, poderia afetar a linguagem utilizada na obra e a forma como ela foi montada.

Um tributo à democracia e um recado para todos os brasileiros, assim que “No Céu da Pátria Nesse Instante” pode ser denominado. Apesar da polarização política e da constante onda de ódio e violência crescerem em progressão geométrica, as instituições democráticas e o país resistem. Mas ainda há muito pela frente, as lutas continuam, mas é sempre bom estar de olhos bem abertos.

Cotação: 5/5 poltronas.

Por: Cesar Augusto Mota

Poltrona Cabine: A Única Sobrevivente/Cesar Augusto Mota

Poltrona Cabine: A Única Sobrevivente/Cesar Augusto Mota

Filmes baseados em histórias reais muitas vezes acabam por atiçar com maior intensidade a curiosidade do espectador, seja para constatar se o que irá ser reproduzido na tela será fiel à realidade ou então ficar por dentro do ocorrido. “A Única Sobrevivente”, produção russa dirigida por Dmitriy Suvorov, se inspira em um acidente aéreo ocorrido há mais de quatro décadas. Será que a obra vai conseguir sensibilizar o público e entregar uma narrativa forte e carregada de emoções?

Em 24 de agosto de 1981, Larisa (Nadezhda Kasleganova) embarca com o marido no voo Na-24, de volta da sua lua de mel. A aeronave colide com um bombardeiro da Força Aérea Soviética cerca de trinta minutos antes do pouso. Presa à fuselagem, Larisa foi a única sobrevivente da tragédia, e ela acorda sozinha em uma floresta e tem de lutar para sobreviver.

Além do acidente em si, o filme consegue retratar bem o regime soviético da época, sob a chancela da KGB, com toda a opressão e tirania do governo russo. Uma obra que transcende ao regime da extinta União Soviética, um caso que foi declarado sigiloso pelas autoridades locais, com os desdobramentos chegando ao conhecimento da sobrevivente apenas dez anos depois.

A narrativa impressiona pela alta carga emocional enfrentada pela protagonista, e o cenário composto por bichos, árvores e o uso de cores frias traduzem o sentimento de perturbação e de medo de Larisa, que mal sabe se ela conseguirá sair dali ou se de fato irá sobreviver. A linguagem corporal da personagem-central prevalece sobre as palavras e é um dos ingredientes que faz o filme ser emocionante e instigante.

A União Soviética também é um personagem nessa história, o contexto de declínio bem apresentado antes do período da Glasnost, proposta por Gorbatchev. Uma autêntica viagem no tempo é realizada e toda a aura hostil e sufocante que a Rússia passou, antes de se tornar uma só nação e ter as quinze repúblicas soviéticas diluídas. A produção é bem chocante e o desfecho é impressionante. Quem não dava nada por esse filem acaba por se surpreender.

Quem é curioso e aficionado por filmes inspirados em situações reais deve ver essa produção, que acaba por entregar um filme de época e regado a muito medo, sofrimento e resistência.

Cotação: 5/5 poltronas.

Por: Cesar Augusto Mota

Poltrona Cabine: Crypto-A Aposta Final/Cesar Augusto Mota

Poltrona Cabine: Crypto-A Aposta Final/Cesar Augusto Mota

O campo das apostas está cada dia mais em evidência e com um engajamento monstruoso, principalmente entre os jovens, com a ilusão de promessas de dinheiro fácil. Além de sites esportivos, as criptomoedas, ou bitcoins, também estão nesse universo, e justamente essa moeda virtual faz parte do contexto de “Crypto-A Aposta Final”, de Cutter Hodierne.

O trio de amigos, Billy, Eva e Dom, em um esquema fraudulento, acabaram por perder tudo o que tinham em suas contas bancárias e na esperança de reaver seus ganhos, sequestram o influenciador e bilionário Charles Hegel, que estava por trás do golpe financeiro das criptomoedas. O plano de sequestro é deveras arriscado, colocando a vida dos três jovens em risco.

A mobilização entre amigos e a busca por grana fácil lembra o filme “Homem das Trevas”, no qual há invasão de domicílio, mas as muitas armadilhas colocaram em risco o grupo de jovens. No universo de “Crypto”, há uma situação semelhante, mas acrescida da ideia de fazer justiça com as próprias mãos. Os planos fechados, o uso de cores frias, jumpscares e sombras tornam a aventura emocionante, cheia de adrenalina e uma atmosfera sufocante.

Há importantes temas nessa obra, como as apostas em si, a influência que subcelebridades da internet conseguem exercer sobre o comportamento dos seguidores e o vício que as bets causam nas pessoas. Mesmo sendo um filme americano, o universo das apostas vem sendo bastante explorado no Brasil, tendo até sido tema em CPI. Quem incentiva outros a apostarem muitas vezes nem se dá conta dos efeitos negativos, e quando sentem as perdas já é demasiado tarde.

Uma aventura eletrizante e com desfecho surpreendente, quem não curte apostas online ou não é fã de aventura mesclada com drama, sem dúvida vai gostar desta narrativa, que não visa somente a recuperação dos rendimentos, mas a sobrevivência dos protagonistas. O antagonista não fica atrás, suas atitudes são para serem relembradas por bastante tempo.

Imprevisível, dinâmico e necessário, também podemos definir assim “Crypto-A Aposta Final”, uma obra que tem tudo para alcançar grandes públicos e alcançar grande audiência. Merece sua apreciação.

Cotação: 5/5 poltronas.

Por: Cesar Augusto Mota

Poltrona Cabine: Vermiglio-A Noiva da Montanha/Cesar Augusto Mota

Poltrona Cabine: Vermiglio-A Noiva da Montanha/Cesar Augusto Mota

O cinema italiano sempre é uma atração à parte para o espectador, seja pelos filmes de época ou os contemporâneos com boas críticas sociais. Uma variação como essa motiva o fã da sétima arte e percebe que as produções italianas vão além de histórias sobre máfia e há variedades de narrativas para todo tipo de público. Aclamado no último Festival de Veneza e representante da Itália no Oscar, “Vermiglio-A Noiva da Montanha”, de Maura Delpero, é um filme intimista e de uma bela estética.

A trama se desenvolve em uma vila alpina, em 1944, local não atingido pela Segunda Guerra, e um soldado desertor aproveita para se refugiar na casa de uma família. Pietro não esperava que Lúcia se aproximasse dele, Flávia, a filha mais nova, vê na educação a única maneira de escapar do ambiente autoritário no qual vive sob as rédeas do pai, Cesare. A esposa, Adele, não tem escolha, e fica presa a uma dura rotina e com dupla jornada, de ser mãe e dona de casa.

O plano aberto predomina na maior parte do tempo do filme e a narrativa é dividida em estações, com transições entre as memórias dos personagens e alguns paralelos traçados entre os dramas do passado e os problemas contemporâneos. Uma discussão sobre sociedade patriarcal e os empecilhos que as mulheres tentam superar no dia a dia é feita de forma didática, e deixa o filme ainda mais interessante de se acompanhar. O sentimento de melancolia prevalece nessa transição de estações, são ciclos se encerrando e dando lugar para outros.

Apesar do ritmo lento, a obra é bastante reveladora, mostra o sentimento de resiliência das personagens mulheres e o poder de seguir em frente em meio a um cenário caótico, de pós-guerra e de forte opressão exercida pelos homens. Tudo é abordado de uma forma realista e com bastante delicadeza. As belas paisagens contrastando com a dor dos habitantes do vilarejo, tudo de uma maneira simples e sutil. Momentos de silêncio e linguagem corporal que disseram tudo.

Histórias universais podem ser contadas de diversas formas, e o uso do impacto e da sensibilidade foram as maneiras encontradas por Maura Delpero para mostrar o quão complexa é a vida e que somos cada vez mais fortes e resilientes, não importa qual seja o cenário.

Cotação: 4,5/5 poltronas

Por: Cesar Augusto Mota