Em uma sociedade predominantemente machista e opressora, a mulher enfrenta desafios diários não só para se reconhecer em meio a dificuldades, como também se firmar e fazer a diferença no meio social. Com direção de Ursula Rosele, o documentário “Abre Alas” compartilha histórias de sete mulheres em uma roda, com histórias de desafios e superações.
Ao longo da produção, Walkíria, Dora, Silvana, Sheila, Regina, Lorena e Heloisa refletem sobre suas escolhas e compartilham suas experiências, repletas de momentos felizes e tristes. Elas atestam que ser mulher requer força e muita resiliência. Não só palavras, mas também é possível ouvir o silêncio, tamanhos foram os traumas e angústias vividos pelas protagonistas.
Histórias envolvendo depressão, abandono, maus-tratos, violência doméstica são partilhadas e nos fazem refletir sobre questões como acolhimento, respeito, empatia e prazer, que foram anteriormente negados e mais tarde conquistados pelas personagens. É possível perceber que a mulher possui uma grande força interior e ela é capaz de transformar amor em força, conseguindo seguir em frente.
O espaço ilustrado no documentário, uma mesa com sete pessoas em volta, não só dignifica um ambiente de amizade e cumplicidade, como também de cura, com os infortúnios e tristezas relatados e todos os meios utilizados para se driblar tudo isso. Mulheres guerreiras e resilientes revelam suas experiências, mas também tornam suas lutas como exemplo para quem possa estar na mesma situação. Uma obra sensível e bastante inspiradora.
“Abre Alas” é sinônimo de renascimento da mulher, e das mais diversas formas. Quem acompanha não vai só simpatizar, como se identificar com as protagonistas. Uma obra honesta, sensível e vibrante.
A cultura coreana vem exercendo forte influência no Ocidente, principalmente na América Latina. O gênero musical K-pop se tornou popular entre jovens, não só pelas letras das músicas, mas também pelas coreografias e comportamento de seus integrantes. Após o sucesso do grupo BTS, em 2023 surge o Zerobaseone, que vem ganhando espaço entre diversos públicos a cada dia.
O documentário “Zerobaseone The First Tour/Timeless World” apresentará ao espectador a turnê 2024 da banda ao redor do mundo, com as principais performances, os bastidores das apresentações e depoimentos exclusivos de todos os integrantes. Quem curte o K-pop certamente ficará curioso para saber tudo o que os artistas pensam, seja sobre o mundo do entretenimento, como também sobre o estilo de vida do coreano. E quem nã0 conhece a banda e o gênero musical vai querer ficar por dentro e aprender sobre a cultura oriental.
No decorrer da obra, um outro lado do Zerobaseone é visto, o de jovens coreanos em ascensão e em aprendizado sobre as circunstâncias da vida. Muitas perguntas podem surgir: Como eles lidam com os problemas do cotidiano? Já experimentaram o stress ou sentiram a pressão para fazer e ficar no auge do sucesso? Como recebem o carinho dos fãs ou já se sentiram ameaçados? Muita curiosidade surge em torno do que é novo, e esse grupo de K-pop não fugiria à regra.
Zerobaseonse se mostrou um grupo homogêneo, com coreografias bem sincronizadas e com vozes hipnotizantes. O talento, a concentração e o perfeito equilíbrio entre os movimentos e o devido encaixe das vozes são os segredos para o sucesso recente desse grupo da quinta geração do k-pop, e com potencial para conquistar públicos de mais partes do mundo, não só na Ásia e América. O documentário não só apresenta a banda, como também explica o fenômeno K-pop e o porquê de causar tanto fascínio, principalmente entre os jovens.
“Zerobaseone The First Tour/Timeless World” é uma ótima opção para quem quer ficar por dentro das novidades do mundo do entretenimento e conhecer mais sobre um gênero musical que não só transmite mensagens como também tem moldado o comportamento das pessoas em um mundo cada vez dominado por tecnologias, que muitas vezes pode provocar afastamento, stress e ansiedade.
A música e o cinema são elementos perfeitos para ilustrar nossos valores, costumes e tudo o que compõe nossa cultura. Além delas, a dança também é sinônimo de expressão, e carrega outras conotações. E justamente para mostrar esses novos significados que acompanhamos o documentário “Corpo Presente”, de Leonardo Barcelos, com o intuito de deleite e, principalmente, reflexão.
Simbolista seria um sinônimo para essa obra, que apresenta diversos artistas e pensadores com contribuições importantes no campo filosófico, político e social. Performances dotadas de coreografias sincronizadas, o tema “corpo” como pano de fundo, assim como depoimentos sobre o tema propõem um importante debate sobre as várias conotações de corpo, muito além de uma matéria ocupando um determinado espaço.
Temas como luta de classes, identidade e gênero foram não só debatidas como apresentadas por meio da dança, com os corpos sinalizando novas ideologias e signos, e transformações constantes para sinalizar que existem novas formas de ser e de estar no mundo. Novos universos são traçados no imaginário das pessoas, bem como os sentidos que podem desempenhar, com várias sensações e reflexões.
Uma espécie de diário em formato visual se apresenta diante dos espectadores, que não só contemplam, como também se imaginam no ambiente e no contexto dos movimentos articulados, numa sensação de verdadeira imersão. Além de ser didático, o documentário proporciona profundas emoções, além de relações bem conexas, entre imagem, som e movimentos, que juntos, formam uma linguagem múltipla.
Uma obra diferente das apresentadas à exaustão, “Corpo Presente” pensa fora da caixa e convida o espectador a fazer o mesmo. Vale a experiência.
Arte e ciência costumam andar lado a lado na vida das pessoas, seja para contemplação ou explicação dos fenômenos do cotidiano. E a maneira como ambos são inseridos em um contexto podem chamar fãs da sétima arte para reflexão. “Termodielétrico”, de Ana Costa Ribeiro, possui esse intuito e proporciona uma viagem pelo passado e traça um paralelo com o presente.
A obra é inspirada na trajetória de Joaquim da Costa Ribeiro, pioneiro da Física no Brasil e inventor do Termodielétrico, objeto de discussão do documentário. Ana Costa, neta de Joaquim, traz imagens de arquivo e reais, visita plantações de palmeiras, jazidas minerais e laboratórios, e convida o espectador a pensar sobre os fenômenos naturais que norteiam nossa vida.
A narração off de Ana Costa, bem como as imagens das viagens de seu avô e os trabalhos desenvolvidos por ele no campo da Física são os principais ingredientes de ˜Termodielétrico”. Perguntas acerca da energia solar, eólica, os comportamentos experimentados diante de adversidades, bem como os relatos da própria diretora acerca dos ensinamentos aprendidos com o avô Joaquim tornam prazerosa a experiência de acompanhar o documentário, de setenta e dois minutos.
Além da estrutura de narração off e perguntas direcionadas da diretora ao público, a fotografia com cores frias também é outro elemento chamativo. O espectador faz uma emocionante viagem no tempo, se deparando com um Brasil em desenvolvimento nos anos 40 e 50, e realiza um retorno abrupto ao presente, se surpreendendo com as mudanças que o campo da Física proporcionou no dia a dia das pessoas. Em dados momentos, temos uma narração em forma de poesia, tendo em vista as belezas que podemos contemplar e as maravilhosas experiências que a vida oferece.
“Termodielétrico” não é apenas didático, é uma carta de amor ao cinema, com ponte entre passado e presente, memórias inesquecíveis e reflexões pertinentes sobre o que fazemos, poderíamos ter feito e o que se faz necessário para um futuro diferente e de melhor contemplação. Uma obra contagiante e necessária.
Filme discute impactos de grandes projetos na Pan-Amazônia a partir da perspectiva de lideranças indígenas que travam luta de “Davi contra Golias” em defesa de seus territórios
Doc Pisar Suavemente na Terra chega ao streaming – crédito: Marcos Colón
José Manuyama, indígena Kukama da Amazônia peruana, lida com a contaminação do rio Nanay pelo garimpo e pelo petróleo. Ele luta contra o mercúrio e as doenças. No Oeste do Pará, o cacique Manoel, do povo Munduruku, tem seu território sitiado pela expansão do monocultivo e exportação da soja, intensificada pelo projeto de agronegócio da Cargill. Luta contra o domínio da terra e a tentativa de extinção da biodiversidade. Enquanto a cacica Katia, do povo Akrãntikatêgê, de Marabá (PA), tenta preservar sua cultura em um território devastado pela mineração da Vale S.A anos após ter visto sua família expulsa durante a implantação de uma Usina Hidrelétrica no coração da Amazônia.
Estes são os personagens que o diretor Marcos Colón apresenta em “Pisar Suavemente na Terra”, que estreia na plataforma de streaming Globoplay a partir de 9 de agosto de 2024, sexta-feira, Dia Internacional dos Povos Indígenas. Com tema de Gilberto Gil, a produção conecta as três histórias por meio da narrativa do imortal Ailton Krenak.
Premiado no Festival Cine Periferias (melhor longa), de Portugal, e no carioca Filmambiente, (fotografia), o filme venceu o prêmio de melhor longa no Ecoador – Festival de Cinema Ambiental (Equador). Este documentário de 73 minutos nos conduz numa jornada repleta de “algo mais”.
Colón leva o público com ele para escutar, aprender, registrar e, agora, divulgar as vozes de Kátia, Manoel, José e Ailton, mas também de seus ancestrais e descendentes. Vozes tão poderosas que vivem no limiar do que parece ser real para a maioria de nós.
Mas eles são reais: os arredores de Santarém, Marabá e Tabatinga, no Brasil; Iquitos no Peru e Letícia na Colômbia são os lares desses defensores da Amazônia que enfrentam um verdadeiro embate “Davi vs. Golias”. Eles lutam contra as engrenagens do Estado e das empresas que destroem a vida sob promessas de “desenvolvimento” e que desencadeiam a morte ao impedir a continuidade da vida e da biodiversidade na região.
A coragem e a sabedoria de Kátia, Manoel e José estão conectadas pela consciência e pela voz de Krenak em uma proposta ousada e revolucionária para salvar a Amazônia (e, com ela, o planeta inteiro): reconhecer que somos parte de algo maior.
Costurados por suas perdas e fortalecidos pela certeza de que precisam sobreviver para lutar pela permanência da floresta, cada um deles nos mostra um modo de vida que, inicialmente, os faz parecer extraterrestres. Em um pensar e viver tão diferenciados que parecem não pertencer a este plano/dimensão/realidade até que, frase a frase, olhar a olhar, em cada riso e lágrima, em cada quadro deste documentário, eles nos mostram que não é possível viver na Terra se não nos reconhecermos como parte dela. Que o costume não-indígena propagado pela lógica (limitada e distorcida) de “desenvolvimento” é o verdadeiro invasor, o estrangeiro, o alienígena.
Krenak aponta que é o modo de viver não-indígena quem cria uma dicotomia de um “nós” apartado “deles/outros” e, diz ele, “esse ‘outros’, para além dos outros seres humanos, é tudo o que é vivo. Aquilo que é chamado de natureza – o rio, a floresta, as montanhas – fica excluído dessa humanidade e ganha um amplo sentido de sub-humanidade, que é todo o resto. [E] a tragédia mais gritante [desse processo] é que o ‘resto’ mais visível [dessa exclusão] é feito de humanos”.
Juntos – Kátia, Manoel, José e Ailton – nos levam à necessidade de aprender a “Pisar suavemente na Terra”, de aprender como humanos a vivermos tão integrados à ela que nossa caminhada não deixaria marcas para trás. Aprender a passar pela vida e pela Terra sem ferir o planeta, sem “comer o mundo” onde vivemos, semeando um pouco dele em nós e, assim, garantir sua continuidade para todos os que virão.
Sinopse
No documentário “Pisar Suavemente na Terra”, três lideranças indígenas da Amazônia tentam manter vivas suas formas de estar no mundo. São as histórias de Kátia, cacica do povo Akrãtikatêjê, de Manoel, cacique do povo Munduruku e de José Manuyama, professor de origem Kokama. Os três narram as ameaças aos seus territórios promovidas pela grande mineração, pelo monocultivo, pelo garimpo, pela exploração de petróleo, pela extração de madeira e pela construção de usinas hidrelétricas. Interligadas pela voz e o pensamento ancestral de Ailton Krenak, esses relatos de resistência nos apresentam outras formas de existir e caminhar no mundo.
Sobre Marcos Colón
Marcos Colón é professor de Mídia e Comunidades Indígenas da Southwest Borderlands Initiative na Walter Cronkite School of Journalism and Mass Communication da Arizona State University. Ele também produziu e dirigiu “Beyond Fordlândia” (“Muito Além da Fordlândia”, 2018). Ele é o editor-chefe e fundador da revista ambiental Amazônia Latitude.