Poltrona Cabine: Um Lindo Dia na Vizinhança/ Cesar Augusto Mota

Poltrona Cabine: Um Lindo Dia na Vizinhança/ Cesar Augusto Mota

O sentimento de humanidade e respeito ao próximo têm se mostrado cada vez mais raros nos dias atuais, e muitas dessas coisas passam pela forma como o mundo é encarado e os problemas são administrados pelas pessoas. Como uma espécie de anjo da guarda das crianças e com um jeito simples, simpático e carismático, o saudoso apresentador Fred Rogers comandou nos Estados Unidos o programa ‘Mister Rogers’ Neighborhood’ por pouco mais de três décadas e se tornou marca registrada do humor e do riso na Terra do Tio Sam. Para relembrar um pouco o artista e seus momentos divertidos, a cineasta Marielle Heller (Poderia me Perdoar?) traz ao público o longa ‘Um Lindo Dia na Vizinhança’ (A Beautiful Day in the Neighborhood), com o astro Tom Hanks (The Post-A Guerra Secreta) no papel principal.

A história se passa em 1998, e no centro da trama está o jornalista ranzinza Lloyd Vogel (Matthew Rhys), que passa por sérios problemas de relacionamento com o pai, Jerry (Chris Cooper), que abandonou sua mãe no leito de morte e apareceu no casamento de sua irmã, para sua ira, tendo saído no tapa. Além disso, Lloyd acaba de ser pai e não consegue tempo para ficar com a esposa Andrea (Susan Kelechi Watson) e o filho Gavin. O profissional, da revista Esquirre, é designado para entrevistar o apresentador Fred Rogers (Hanks) e tem de escrever um artigo curto sobre figuras tidas pela sociedade como heróis. Durante as entrevistas, ele passa a ter outra visão sobre sua vida e desenvolve uma amizade até então improvável com o artista.

O universo pueril do programa de Fred Rogers é perfeitamente retratado com suas maquetes, tomadas aéreas que valorizam o cenário e a imagem com tons pastéis dando sensações de alegria e descontração para quem vê. O apresentador pode também ser visto na manipulação dos bonecos, bem como uma visão dos bastidores da atração, com os câmeras, diretores e produtores. A parte técnica é primorosa, com tomadas que retratam um filme de época e no contexto dos anos 90, com as tecnologias da época, vestuário e o avanço da internet. O figurino do apresentador é identificado com o público alvo do programa, e o uso de um quadro com portas e fotos por trás é uma maneira original de atrair a atenção e abrir portas para mundos e cotidianos diferentes, conforme ele faz durante a história até chegar ao segundo protagonista, o jornalista Lloyd Vogel.

Os arcos dramáticos dos dois personagens centrais são devidamente amarrados, com o jornalista sendo mostrado como alguém que sofre em decorrência das escolhas feitas na vida, e o apresentador também é mostrado por esse prisma, com tomadas de flashback ilustrando sua alimentação, constantes práticas de mergulho e a relação com a família. E quando ambos se encontram e a primeira entrevista começa, uma novidade é apresentada, o entrevistado (Rogers) se interessa pela vida do entrevistador (Vogel), mas tudo o que o jornalista gostaria de saber ainda não lhe é entregue, as respostas surgem gradualmente.

A serenidade e pureza de espírito de Rogers são facilmente notadas, mas o filme se atém mais ao ícone e não explica o porquê de ser tão cultuado. Falta profundidade a ambos, mas o dinamismo e interação entre os dois são consistentes e as mensagens transmitidas de respeito ao próximo e formas de mudar a visão de mundo se dão de maneira fluida. Hanks carrega o filme com muita maestria e não há como não se impressionar com a forma que entrega ao personagem, com expressões corporais e a simpatia que empresta ao personagem. Matthew Rhys (O Relatório) entrega o que é esperado de seu personagem, mas é prejudicado pelo roteiro raso, que poderia explorar outras camadas de Lloyd Vogel, bem como dos personagens secundários, que servem mais como muletas para os protagonistas, mas logo são esquecidos.

Com boa didática, um drama sólido e muitos momentos cômicos, ‘Um Lindo Dia na Vizinhança’ entretem o público e garante boas horas de descontração, mas não mostra a visão de mundo de outros personagens e tampouco desmistifica o mito criado em torno da figura de Fred Rogers. É uma produção com excelente proposta de diversão, mas nada além disso.

Cotação: 3,5/5 poltronas.

Por: Cesar Augusto Mota

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