Poltrona Cabine: Não Mexa com Ela/ Cesar Augusto Mota

Poltrona Cabine: Não Mexa com Ela/ Cesar Augusto Mota

Retratar o universo feminino no cinema envolve não só detalhar suas nuances, mas também seus desafios constantes. A mulher não só conseguiu se firmar na sociedade, mostrando que era muito mais que uma dona de casa, como também capaz de chegar ao mercado de trabalho e realizar com competência ofícios desempenhados por homens. Mas ela ainda enfrenta caminhos árduos, como ter de lidar com o preconceito e sofrer assédio sexual. E é justamente esse segundo mal que será apresentado na narrativa de ‘Não Mexa com Ela’, filme israelense de Michal Aviad, uma triste realidade que ocorre em Israel, no Brasil e em várias partes do mundo. Um problema sério e que não pode deixar de ser combatido.

Com uma família numerosa e sérias dificuldades financeiras por conta da pouca clientela do restaurante recém-inaugurado do marido, a jovem Orna (Liron Ben Shlush) toma a iniciativa de voltar a trabalhar e entra no ramo imobiliário, como secretária. Sua competência e tino para os negócios não só chamam a atenção de seu chefe, Benny (Menashe Noy), que logo a promove à gerente de vendas. Orna, por conta de sua rápida ascensão, passa a ser a principal provedora de sua casa e ao mesmo tempo em que cresce na empresa ela passa a ser alvo de assédio de seu superior. De início ela pensa se tratar de meros elogios, mas a situação piora e ele se sente envolvida em meio a uma teia e com muitas dificuldades para sair dela.

A diretora Michal Aviad opta em tratar do assédio de uma forma gradual, e não o de inserir uma cena forte e posteriormente usar flashbacks. Na primeira investida de Benny, que sugere que Orna solte os cabelos e se vista de forma mais sensual até a tentativa de beijá-la leva um certo tempo, mas esse ritmo lento até chegar a ocasiões mais chocantes é empregado de forma proposital para que o espectador fique angustiado e ao mesmo tempo curioso para saber qual irá ser a reação da vítima e qual o próximo passo ela vai dar. E tudo é feito de uma forma sutil e precisa, numa vibe bem envolvente e clima de alta tensão.

O uso de planos mais fechados e a câmera acompanhando a protagonista pelas mais diversas locações, seja no local de trabalho, em uma construção ou até mesmo nos cômodos de sua casa para acompanhar sua angústia e estado de choque contribuem para um envolvimento maior do espectador com o drama da personagem principal, além de fazê-lo se por no lugar dela e levantar alguns questionamentos não só em relação ao assediador, mas como ela mesma. A proposta não é a de julgar a vítima ou de criticar suas atitudes, mas a de mostrar que o problema existe, que precisa ser resolvido e cada um reage de uma forma.

As atuações do elenco são de encher os olhos e mostram os comportamentos dúbios dos dois personagens que dividem a atenção do público: o chefe da imobiliária, que sabe do valor de sua funcionária e a valoriza dentro da empresa, além de olhar para ela de maneira desejante e todas as investidas que faz; além da mãe de família que trabalha arduamente e mostra um comportamento inicialmente passivo, num claro choque emocional pelos constantes assédios e o sentimento de culpa por achar que provocou as situações. A sagacidade de Liron Ben Shlush de mostrar fragilidade e depois força com sua personagem mostra claramente seu incômodo com os constantes assédios sofridos, capaz de causar empatia com o público. Já Menashe Noy, que vive o patrão, incorpora de forma competente o superior, alguém que pensa que sairá por cima e nada lhe irá acontecer por gozar de uma posição privilegiada, provocando indignação na plateia e ao mesmo tempo visualizar o sentimento de impotência da vítima. Um belo trabalho de elenco e também da direção, que soube aproveitar as performances de cada ator e tornar a história ainda mais empática, humana e engajante.

Um filme envolvente, perturbador e, principalmente, necessário. ‘Não Mexa com Ela’ é uma produção com um assunto de cunho universal e que lamentavelmente ainda está distante de uma resolução. O cinema a cada dia alcança novas vertentes, de entretenimento, informação e também de conscientização. Uma obra que vale ser acompanhada.

Cotação: 4/5 poltronas.

Por: Cesar Augusto Mota

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