Poltrona Cabine: Diamantino/ Cesar Augusto Mota

Poltrona Cabine: Diamantino/ Cesar Augusto Mota

Em muitas ocasiões, o esporte, principalmente o futebol, foi tratado como um alívio, uma válvula de escape para povos mergulhados em diversos dilemas sociais e problemas econômicos. A prática esportiva é encarada como um momento de descontração e de felicidade, ainda mais quando o país representado é bem-sucedido em competição internacional. Em ‘Diamantino’, produção portuguesa dirigida por Gabriel Arantes e Daniel Schmidt, o protagonista vai na contramão do comportamento de um autêntico ídolo, cultuado pelo que faz e ovacionado pelo que representa a uma nação. Uma das frases dessa trama que define be m o dito anteriormente é ‘o futebol é o ópio do povo’.

Na narrativa, Diamantino (Carloto Cotta) é o mais popular e melhor jogador de futebol da atualidade. Ele estava em ascensão em sua carreira, mas tudo vira de pernas para o ar quando ele desperdiça um pênalti na decisão da Copa do Mundo contra a Suécia e provoca a derrota de Portugal, decepcionando milhões de torcedores. Além disso, ele passa por uma experiência desagradável e traumática com um grupo de refugiados, e isso faz ele decretar o fim de sua carreira nos campos. Fora das quatro linhas, resolve adotar uma criança africana exilada e utilizar sua fortuna para causas sociais. Mas ele será assessorado por suas duas irmãs más, que fazem lavagem de dinheiro em off-shores. Suspeito em envolvimento com transações ilícitas, uma equipe de espionagem a serviço do governo português entra em ação, que aproveita para utilizar a imagem de Diamantino em prol dos interesses do próprio país.

O roteiro não se limita apenas a tratar da carreira e da imagem do jogador de futebol Diamantino, mas também dos desdobramentos da situação econômica e política de Portugal, que vivia uma crise quase tão caótica como a ocorrida de forma global em 2008, com o governo do país disposto a aproveitar a popularidade do atleta para usar sua imagem em campanhas publicitárias num plebiscito para incentivar o eleitor a votar pela saída de Portugal da União Europeia. De quebra, o espectador é brindado com o mundo paralelo em que o protagonista vive, alheio à realidade e inserido num mundo de fantasia, representado por enormes nuvens brancas e cachorrinhos peludos e gigantes. Uma representação visual espetacular e convidativa para um jeito bem diferente de fazer cinema.

A narrativa investe na mescla de vários gêneros, apostando na comédia e na espionagem, que se acentua na reta final da trama. O protagonista, que também se envolve em uma constante perseguição e num plano diabólico de ter seu DNA transferido para 11 corpos para a construção de um time de futebol imbatível, mostra ao público o mundo sob sua ótica, além de apresentar grandes peripécias e ilustrar muito bem seu lado humano, uma pessoa como as outras, que não está imune às frustrações e as maldades que nos rodeiam. A mescla de realidade e ficção é o chamariz da trama, que motiva o espectador a acompanhar a odisseia de Diamantino e todo o seu desenrolar, se ele vai escapar ileso ou se será completamente dominado por uma poderosa corporação, que promete não deixar barato para extrair tudo o que pode de um ícone de Portugal.

‘Diamantino’ ilustra uma autêntica jornada do herói, numa interpretação honesta e épica de Carloto Cotta, com um visual semelhante ao craque português Cristiano Ronaldo, vaidoso e também de bom coração. A capacidade de reinvenção do personagem central é impressionante, que preferiu não mergulhar na solidão e amargura e optou por um novo rumo, com o intuito de ajudar ao próximo e aproveitar os prazeres que a vida pode lhe oferecer. O filme oferece um grande leque de opções ao espectador e muitas lições sobre poder, fama, cobiça e, principalmente, importantes apontamentos sobre a xenofobia e a discriminação, preconceitos ainda recorrentes nos dias de hoje. Quem acompanha sai da sala de exibição satisfeito, vale a pena.

Cotação: 4/5 poltronas.

Um comentário sobre “Poltrona Cabine: Diamantino/ Cesar Augusto Mota

Deixe um comentário