Maratona Oscar: O Insulto/ Cesar Augusto Mota

Maratona Oscar: O Insulto/ Cesar Augusto Mota

Você sem dúvida já ouviu muitas vezes que palavras podem machucar mais que uma agressão física, certo? E é justamente por meio dessa premissa que foi concebido ‘O Insulto’, filme libanês do diretor Ziad Doueiri, uma produção que vem recebendo avaliações positivas da crítica e baseada em uma história real, ocorrida com o próprio cineasta.

Toni Hanna (Adel Karam) é libanês e membro do partido cristão, e possui como hábito regar suas plantas de sua varanda. Um dia, por acidente, acaba molhando Yasser Salameh (Kamel El Basha), um refugiado palestino. Ao perceber que a calha da residência de Toni estava com defeito e molhando os pedestres, Yasser, por sua iniciativa, resolve consertar, mas o serviço é posteriormente desfeito por Toni. Não satisfeito, Yasser insulta Toni, que explode de raiva e exige um posterior pedido de desculpas. Na tentativa de se desculpar, o palestino é surpreendido com uma forte declaração, que fere sua honra, dignidade e o contexto histórico de seu povo, e revida com um forte soco em Toni, quebrando suas costelas. A partir daí, uma questão que era apenas entre particulares começa a tomar grandes proporções, e um forte circo midiático é montado, envolvendo todo o Líbano, inclusive o presidente do país, para resolver a questão.

O roteiro, assinado em conjunto por Ziad Doueiri e Joelle Touma, traz não só a raiva e a intolerância, mas a insurgência entre libaneses e palestinos, existente há pouco mais de cinco décadas, o  principal pano de fundo da história. Este é um problema enraizado e ainda não cicatrizado, que mexe com milhares de famílias, que sofrem com constantes perseguições e vidas sendo dizimadas. O mérito do filme está em conseguir juntar todos esses fatos, estruturá-los e passar para o público uma história verossímil, que aborde não apenas um conflito isolado entre duas pessoas, mas todo o drama de duas nações, além da parcialidade e da corrupção existentes no poder Judiciário, esta última nos lembrando um pouco do que acontece na realidade atual da sociedade brasileira, com constantes e intermin&aacute ;veis discussões.

E outro elemento que funciona muito bem durante o filme é a montagem, que não fica restrita às filmagens nas ruas de Beirute, mas também no tribunal onde o caso Toni-Yasser irá ser julgado, e algumas tomadas em Israel, local onde se iniciaram os dramas vividos até hoje pela comunidade palestina. Cada cena gravada, com planos mais fechados nos rostos dos protagonistas e depois nos ambientes familiares, nos dá o tom da dramaticidade que o longa irá apresentar ao espectador, antes de chegarmos ao clímax da história, quando o caso ganha cobertura ampla dos canais de televisão e batalhas campais passam a acontecer nas ruas de Beirute, espalhando pânico, incertezas e terror. Não é apenas Toni contra Yasser, mas os cristãos libaneses se opondo aos refugiados palestinos, o futuro de dois povos em jogo e que vai nos fazer importantes revelações, inclusive traumas do passado desses povos, como também dos protagonistas.

As atuações do elenco são acima da média, não apenas o núcleo principal se destaca, como também o secundário, com os advogados de acusação e de defesa, Wajdi Wehbe (Camille Salameh) e Nadine Wehbe (Diamand Bou Abboud), que são curiosamente pai e filha na trama, além da juíza Colette Mansour (Julia Kassar), de quem todos esperam um veredito justo. A cada dia de julgamento, as partes surpreendem com as provas e testemunhas convocadas e discussões acerca das diferenças, da falta de tolerância e reflexões sobre o passado e o futuro do Líbano e da Palestina são inseridos, com importância decisiva na condu&cce dil;ão final da trama. O espectador não fica a favor de um lado e contra o outro, cada extremo é abordado de forma cuidadosa e com os elementos necessários para prender a atenção e sensibilizar a todos, um perfeito trabalho do corpo de atores, aliado à equipe técnica.

Agraciado com o Audience Award da American Film Institute e com o prêmio de melhor ator para Kamel El Basha no Festival de Veneza, ‘O Insulto’ vem forte para o circuito comercial e com importantes mensagens, é preciso amor, tolerância e rever as diferenças. Agressões físicas podem até machucar, mas ferimentos causados por palavras podem demorar ou até mesmo não cicatrizarem.

Avaliação: 4/5 poltronas.

 

 

Por: Cesar Augusto Mota