Imã de Geladeira estreia na Mostra Tiradentes

Imã de Geladeira estreia na Mostra Tiradentes

Filme sergipano “Ímã de Geladeira” estreia na Mostra Tiradentes

O curta será exibido nos dias 24 e 25 de janeiro na plataforma do evento

Estrear um filme na Mostra de Cinema de Tiradentes é um desejo de muitos realizadores audiovisuais do Brasil, graças ao respaldo do evento em revelar filmes nacionais e à tradição de abrir o calendário anual do cinema brasileiro. Na 25ª edição do evento, Carolen Meneses e Sidjonathas Araújo representarão Sergipe ao lançar o filme ‘Ímã de Geladeira’ nesta segunda-feira.

O filme integra a Mostra Praça e ficará disponível durante 24 horas a partir das 19 horas do dia 24 de janeiro no site oficial do evento, por onde também ocorrerá o bate-papo ao vivo com os diretores nesse mesmo dia, às 21 horas.

Ímã de Geladeira é um curta-metragem de ficção que transita entre os gêneros cinematográficos terror e fantasia para narrar a vida de um jovem casal preto que vive numa periferia sergipana. Com uma narrativa afro-surrealista, o filme discorre sobre a violentação aos corpos negros e periféricos e sua espetacularização pelos meios de comunicação de massa.

“A fabulação através do surreal é uma maneira de falar de algo tão profundo como o genocídio da população negra sem tocar diretamente nos traumas sofridos por nosso povo. E, mais, sem contribuir para as narrativas hegemônicas que mantêm o imaginário social sedento pelo espetáculo sangrento”, explica o co-diretor  Sidjonathas.

Demarcação racial

Único filme sergipano desta edição do evento sudestino, “Ímã de Geladeira” faz uma importante demarcação racial em um espaço tradicionalmente ocupado por maioria branca, como grande parte das mostras de cinema do Brasil. A presença de dois diretores negros com um filme gravado na periferia do menor estado do país diz muito sobre o próprio tema da mostra: cinema em transição.

“Neste momento, sentimos o cinema mais próximo de nós. O movimento de cinemas descentralizados e cinemas negros vêm construindo há décadas um caminho – por vezes de formas muito precárias – para que hoje possamos discutir e vivenciar uma mudança cinematográfica”, contextualiza Carolen Meneses, co-diretora e roteirista do curta.

“Ímã de Geladeira” se soma a recentes produções afro-brasileiras que engrossam o caldo do que tem sido chamada de “primavera do cinema negro”, um movimento de ascensão de narrativas com protagonismo preto e de estreia de jovens negros cineastas, possibilitado no país pelo incentivo à democratização do acesso universitário e dos recursos públicos para o setor audiovisual.

Produzido no ano de 2020 durante a pandemia de Covid-19 seguindo todos os protocolos de saúde, o filme foi apoiado por políticas públicas emergenciais de cultura, o que revela, segundo Carolen, “que o estado de calamidade forçou a descentralização e desburocratização dos recursos e nos deu a possibilidade de acessá-los”.

O projeto foi apoiado pelo Edital de Premiação para Produção e Exibição Cultural proposto pelo Governo do Estado de Sergipe através da Fundação de Cultura e Arte Aperipê de Sergipe – FUNCAP/SE, com recursos da Lei Federal 14.017/2020 – Lei Aldir Blanc.

PROGRAME-SE

Filme ‘Ímã de Geladeira’

Direção: Carolen Meneses e Sidjonathas Araújo

Filme Ficção, 19’45”, 2022, São Cristóvão-SE

Classificação indicativa: livre

Na 25Mostra de Cinema de Tiradentes – Mostra Praça

Exibição entre 24 (a partir de 19h) e 25 de janeiro (até 19h)

Bate-papo com diretores no dia 25 de janeiro às 21h

No site mostratiradentes.com.br

A imaginação como potência erá a temática da 23ª Mostra de Tiradentes

A imaginação como potência erá a temática da 23ª Mostra de Tiradentes

A força da imaginação é o norte eleito da 23a Mostra de Cinema de Tiradentes, a que permite que algum futuro seja vislumbrado mesmo diante de um presente saqueado pelo conservadorismo e pela legitimação da intolerância. Uma solução, portanto, é ser propositivo diante de um cenário incerto, é olhar adiante e enxergar na arte e na criação os caminhos possíveis para novos rumos. A temática da Mostra este ano segue por essa via: “A imaginação como potência”.

A Mostra será realizada entre os dias 24 de janeiro e 1o de fevereiro, na cidade histórica mineira. A curadoria, sob coordenação do crítico Francis Vogner dos Reis, propôs essa temática para reforçar que, mesmo numa época de dúvidas, o cinema brasileiro vive um momento de absoluta efervescência criativa e de recepção. “O que emerge na atual produção no país é o desejo de interpretar nossa experiência hoje, de projetar caminhos possíveis, de provocar imagens que nos remetam a uma perspectiva sobre o passado tendo em vista não só um olhar original sobre fraturas sociais e políticas, mas também uma superação destas num desejo de futuro”, destaca Francis. “Existem filmes, documentários e ficções, que olham o presente e colocam as coisas em termos históricos, atentando para o mundo como ele é e se questionando como ele poderia ser”.

Mas como o cinema pode ser esse ambiente de preservação de um futuro sabotado? Ora, ficções e documentários, sejam em curta, média ou longa-metragem, têm sido espaço para o testemunho e registro da ação política do presente, reconfigurando formas de olhar e de abordar o que está diante da câmera. “Os filmes imaginam outros mundos, outras possibilidades de existência, permitem ver o real transfigurado para além do fatalismo que a mediocridade política insiste em apontar como a única realidade possível”, exalta o coordenador curatorial. “Como arte, o cinema é capaz de inverter as lógicas sociais e de linguagem, de contrapor a beleza à barbárie, a provocação à conciliação. O cinema pode forçar a imaginação nos seus limites”.

HOMENAGEM: ANTÔNIO E CAMILA PITANGA

Diante dessa perspectiva, a 23a Mostra de Cinema de Tiradentes homenageia esse ano os atores Antônio Camila Pitanga. Pai e filha, homem e mulher, negro e negra, 80 e 42 anos. Ícones de seus próprios tempos, por motivos e trajetórias distintas, Antônio e Camila emulam em seus corpos e suas posturas a brasilidade mais original e singular, o talento e a presença de quem vivencia as contradições do país por dentro. Para Francis Vogner dos Reis, “homenagear os dois juntos é afirmar não só suas trajetórias, mas também reconhecer suas diferenças – criativa, simbólica e política”.

Entre a centralidade de Antônio Pitanga na revolução do Cinema Novo, entre o final dos anos 1950 e meados dos anos 1970, e a constância de Camila Pitanga no imaginário da TV e do cinema nas últimas duas décadas, estão a diversidade e a força de duas formas de trabalhar e mapear uma história do audiovisual brasileiro que atravessa ambos.

Pitanga, o pai, nasceu em 1939 em Salvador. Fez teatro e cinema desde muito jovem e estreou nas telas em 1960 com “Bahia de Todos os Santos”, de Trigueirinho Neto. Seguiu numa série de filmes marcantes que remodelaram todo um jeito de fazer cinema no Brasil: “A Grande Feira” (Roberto Pires, 1961), “O Pagador de Promessas” (Anselmo Duarte, 1962), “Barravento” (Glauber Rocha, 1962), “Ganga Zumba” (Carlos Diegues, 1963), “Os Fuzis” (1964) e por aí adiante.

“Quando ele surge, sua presença impõe uma energia e radicalidade de gestos que destoavam do ritmo mais lento e calculado de atores até então em voga”, afirma Francis. “A liberdade dos personagens de Pitanga era plena e na contramão do mundo. Entre os heróis do Cinema Novo, ele era o único que de fato preconizava uma liberdade à revelia da violência cerceadora do mundo ao qual os filmes se referiam”.

Para o curador, essa liberdade aparecia no corpo, com os personagens de Pitanga constantemente se insurgindo contra a violência do presente, porque atento às circunstâncias, e do futuro, porque revolucionário. “Em Antônio Pitanga, essas temporalidades coexistem”, define Francis.

Pitanga, a filha, nasceu em 1977 no Rio de Janeiro. Estreou nos cinemas ainda criança, junto com o irmão Rocco, num filme emblemático: “Quilombo” (1984), de Carlos Diegues, que marcou época por reunir um histórico elenco negro que incluía Grande Otelo, Zezé Motta, Antonio Pompêo, Tony Tornado, Léa Garcia, Milton Gonçalves, Zózimo Bulbul e Antônio, pai de Camila.

Dali adiante, a trajetória cinematográfica de Camila Pitanga transitou por praticamente todos os tipos de filmes realizados do Brasil desde a Retomada nos anos 1990: infantil (“Super Colosso”, Luiz Ferré, 1995), comédia derivada da TV (“Caramuru – A Invenção do Brasil”, Guel Arraes, 2001), drama histórico (“O Preço da Paz”, Paulo Morelli, 2003), aventura social (“Redentor”, Cláudio Torres, 2004), radicalismo (“O Signo do Caos”, Rogério Sganzerla, 2004), melodrama criminal (“Eu Receberia as Piores Notícias de Seus Lindos Lábios”, Beto Brant, 2011) e documentário, filmando justamente a trajetória do pai, em “Pitanga” (2017, codireção de Beto Brant).

FILME DE ABERTURA: MOSTRA HOMENAGEM – PRÉ-ESTREIA MUNDIAL | “OS ESCRAVOS DE JÓ”

Para abrir a 23a Mostra de Cinema de Tiradentes, o filme escolhido trafega na imaginação libertária do cinema brasileiro e tem Antônio Pitanga no elenco. “Os Escravos de Jó”, do diretor cearense Rosemberg Cariry e filmado em Ouro Preto, estará em pré-estreia mundial na noite de 24 de janeiro, no Cine-Tenda. No filme, o 12o longa-metragem de Cariry, os estudantes Samuel e Yasmina se apaixonam na cidade mineira e precisam vencer dificuldades e preconceitos para afirmarem o amor. Personagens do passado e do presente cruzam os caminhos dos jovens, arrastando-os para um inesperado destino.

No enredo, Pitanga interpreta um livreiro amigo do protagonista e foi especialmente convidado para o papel pelo diretor Rosemberg Cariry. “Ele faz esse velho livreiro de ascendência judaica, chamado Jerémie Valés, imigrante do norte da África com história de vida passada também na França. Um personagem que viveu os horrores da Segunda Guerra Mundial, mas que manteve viva a esperança e a chama da poesia”, conta Cariry.

Para o cineasta, ter Antônio Pitanga em “Os Escravos de Jó” foi um privilégio. “Ele é um grande ator, por quem tenho admiração e respeito. Afora o reconhecido talento para o cinema e para o teatro, Pitanga é uma pessoa de alma boa, do bem. Está sempre disposto a colaborar e faz, com a sua criatividade, o filme crescer”, exalta Cariry. “Além do extraordinário artista que é, Pitanga é um cidadão politicamente consciente e de ideias libertárias. Em resumo: é um grande brasileiro, um dos símbolos do nosso povo e do nosso cinema”.

O longa-metragem “Na boca do mundo” (1978), com direção e atuação de Antônio Pitanga, e os longas “Eu receberia as piores notícias de seus lindos lábios” (2011), de Beto Brant, com Camila Pitanga no elenco; e “Pitanga” (2016), dirigido por Camila sobre a trajetória e carreira do pai, completam a seção Mostra Homenagem.

SOBRE A MOSTRA DE CINEMA DE TIRADENTES

Maior evento dedicado ao cinema brasileiro contemporâneo em formação, reflexão, exibição e difusão realizado no país. Apresenta, exibe e debate, em edições anuais, o que há de mais inovador e promissor na produção audiovisual brasileira, em pré-estreias nacionais, de longas e curtas – uma trajetória rica e abrangente que ocupa lugar de destaque no centro da história do audiovisual e no circuito de festivais realizados no Brasil.

Trata-se de um programa audiovisual que reúne todas as manifestações da arte numa programação cultural abrangente oferecida gratuitamente ao público que prevê a exibição de mais de 100 filmes brasileiros em pré-estreias nacionais, mais de 40 sessões de cinema, homenagens, oficinas, debates, seminário, mostrinha de cinema, exposições, lançamento de livros, teatro de rua, shows musicais, performance audiovisual, encontros e diálogos audiovisuais e  atrações artísticas.

TODA PROGRAMAÇÃO É OFERECIDA GRATUITAMENTE AO PÚBLICO.

Mostra de Cinema de Tiradentes cumpre sua vocação

Mostra de Cinema de Tiradentes cumpre sua vocação

Em 22a edição, evento cumpre sua vocação de expandir a experiência do cinema dentro e fora das telas e honrar o compromisso de um evento cultural de grande importância econômica e social

O ano de 2019 foi de reafirmação da Mostra de Cinema de Tiradentes como evento de importância nacional e da defesa da cultura como fundamental no desenvolvimento de um país. Equivalendo atualmente a 2,64% do PIB brasileiro, empregando diretamente cerca de um milhão de pessoas, contratando cerca de 200 mil empresas e instituições envolvidas e gerando R$ 10,5 bilhões de impostos diretos (segundo dados do Ministério da Cultura divulgados no ano passado), a economia da cultura é uma das áreas de maior efervescência no crescimento nacional.

Em especial no caso do cinema, um estudo da Ancine divulgado em 2015 revelou que o valor gerado só pelo setor audiovisual brasileiro teve aumento de 65,8% entre 2007 e 2013, uma expansão de 8,8% ao ano. Citando o IBGE, o relatório aponta que as atividades econômicas do audiovisual foram responsáveis por uma geração de R$ 22,2 bilhões em 2013 (em 2007, foram R$ 8,7 bilhões).

Projetos realizados pela Lei Rouanet, importante instrumento de fomento à cultura, tiveram impacto na economia brasileira de mais de R$ 2 bilhões em 2018, conforme o mesmo estudo do Ministério da Cultura. Um total de 3.197 projetos culturais captaram R$ 1,288 bilhão em recursos, tanto de pessoas físicas quanto jurídicas. Foi o terceiro maior montante de captação nos 27 anos de existência da lei, cuja taxa de incentivos fiscais, em relação a todos os incentivos concedidos no país em diversos os setores da economia, representa apenas 0,64% do total.

Uma pesquisa da Fundação Getúlio Vargas atestou o impacto direto (R$ 31 bilhões) e indireto (R$ 18,5 bilhões) de projetos via Lei Rouanet entre 1993 e 2018. Esse valor de quase R$ 50 bilhões é muito maior do que o valor diretamente investido pelos incentivos fiscais (R$ 17,6 bilhões), mostrando o fôlego do setor na multiplicação econômica – ainda mais se considerarmos que a renúncia fiscal via Rouanet é muito baixa se comparada a outros setores que consomem bem mais desse mecanismo. Outra pesquisa recente aponta que, de todos os projetos financiados pela Rounaet, aproximadamente 70% são de até R$ 500 mil.

“É importante ter um entendimento de que é a indústria do entretenimento a que mais cresce no mundo, gera empregos, renda e oportunidades”, diz Raquel Hallak, coordenadora da Mostra Tiradentes e diretora da Universo Produção. 

PELOS CORPOS DO CINEMA

O corpo na tela, o corpo no palco, o corpo na plateia. Corpos cênicos e corpos-cinema, corpos da realidade e corpos da ficção. Na 22a Mostra de Cinema de Tiradentes, a temática dos “Corpos Adiante” explodiu para além dos filmes, dos debates e dos encontros. Ela impregnou as energias, as trocas, os fluxos, num contínuo que contaminou os nove dias de evento na cidade histórica mineira.

Proposta pelo coordenador curatorial Cléber Eduardo, a ideia se expandiu e se renovou. “Antes do corpo no cinema, porém, o corpo está em todo lugar”, já adiantava o curador desde a proposta. “Se estes corpos como pluralidade são em parte homogeneizados pelo capital investido, consumido e lucrado com suas superfícies e com seus organismos, estes mesmos corpos também são as matérias a partir das quais se travam alguns dos principais debates e embates em torno de identidades em geral, das perseguições e dos cultivos das origens étnicas/raciais às transformações, manutenções e ampliações das origens de gênero”. A curadoria deste ano na Mostra contou com a equipe formada por Lila Foster e Victor Guimarães (longas-metragens), Pedro Maciel GuimarãesTatiana Carvalho Costa e Camila Vieira (curtas-metragens).

Com objetivo de pensar a questão em relação a outras manifestações artísticas, a Mostra levou a Tiradentes profissionais de artes cênicas, artes visuais, música e literatura para conversarem sobre a temática ao longo de toda a semana. Entre uma mesa e outra, todos e todas levantaram pontos fundamentais. Para a pesquisadora Amaranta César, “a dinâmica entre reconhecimento do corpo como algo que nos ultrapassa significa reconhecer estruturas opressoras e limitadoras históricas. O cinema contribuiu, ao longo do tempo, como agente de apagamento de corpos ou de reinvenção e reapropriação”.

Também crítica e pesquisadora Luciana Romagnolli aponta que a consciência do corpo como presença é uma diferença essencial, por exemplo, entre teatro e cinema: num, há a afetação direta; no outro, a intermediação tecnológica, ou “tecnovivial”, como ela afirma, convocando um conceito do professor argentino Jorge Dubatti. “Como os corpos se relacionam no teatro e no cinema com o que já existe? E com o que não existe?”, pergunta.

A questão do que é real ou ficcional voltou a aparecer ao longo das conversas e dos filmes da Mostra, porém sem enveredar pela já batida discussão sobre o que é ficção ou documentário. Enfim as fronteiras estão se rachando, e muitos espectadores hoje deixam se importar com isso para mergulharem nas propostas estéticas e narrativas de filmes difíceis de categorizar, como “Inferninho” (Guto Parente e Pedro Diógenes), “Vermelha” (Getúlio Ribeiro), “A Rosa Azul de Novallis” (Gustavo Vinagre e Rodrigo Carneiro) e “Calypso”(Rodrigo Lima e Lucas Parente), entre outros. No caso de “Inferninho”, o crítico João Dumans elogia o uso do melodrama como catalisador de emoções e a chave para rachar as estruturas de gênero do filme. “O movimento é o de dar ao melodrama a possibilidade de aqueles personagens se expressarem. Os diretores não fazem isso só como referência, e sim levam a sério para a construção dos sentimentos”.

Os limites também foram testados em “A Rosa Azul de Novallis”, no qual o ator Marcelo Diorio se expõe como personagem de si mesmo e rememora o passado e o próprio presente. “Gosto de me concentrar numa única pessoa a ser filmada e me entregar ao risco. Faço meus filmes num curto espaço de tempo e com chances de dar errado, mas eles funcionam justamente pela capacidade das pessoas que eu filmo de serem outras pessoas semelhantes a elas mesmas”, conta o codiretor Gustavo Vinagre.

PERMANÊNCIAS

Toda a discussão sobre identidades e presenças inevitavelmente chegou a questões caras da sociedade brasileira nos últimos anos: raça, gênero, violência, opressão e o papel do Estado na vida econômica e social de indivíduos plurais. Na tela, filmes como “Temporada” (André Novais Oliveira), “Tremor Iê” (Lívia de Paiva e Elena Meirelles), “A Rainha Nzinga Chegou” e “Negrum3” (Diego Paulino) pautaram muitas das conversas a partir da importância desses assuntos. “Quando digo que tudo é para todo mundo, é porque é. O caminho é longo, mas ele é nosso também, e uma hora ele chega”, diz Isabel Casimira Gasparino. Em seu filme, ela viaja à África em busca de suas raízes e das origens da Rainha Nzinga. “Ir ao Congo foi um renascimento e uma reafirmação de que tudo que eu tinha aprendido sobre meus antepassados era verdadeiro”, exalta. Sentimento similar pôde ser visto no curta “NoirBLUE – Deslocamentos de uma Dança”, de Ana Pi, quando ela narra que, ao desembarcar na África pela primeira vez, ouviu de um agente de migração que ela estava em casa. “Bem-vinda de volta”, disse ele à diretora.

Ao falar sobre o curta “Negrum3”, o diretor Diego Paulino o define como “um ensaio sobre negritude, viadagem e aspirações espaciais dos filhos da diáspora”. Muito aplaudido na sessão do Cine-Tenda, o filme tem pegada alto astral, cores explosivas e muita música, além de forte carga política e de denúncia. “‘Negrum3’” surgiu a partir da raiva. Eu quis transformar a minha raiva em ação. Um corpo negro, para se movimentar, precisa de uma espécie de armadura para sobreviver às microagressões da sociedade. Então minha solução, com o filme, foi ser o mais sincero possível”, diz Diego, que trabalhou com equipe de produção preponderantemente formada por pessoas negras no intuito de permitir que o mergulho naqueles sentimentos em tela fosse o mais pleno possível. “Se você está disposto a criar uma nova narrativa, você também precisa estar disposto a derrubar a pirâmide social da exploração atrás das câmeras. Filmes vão e processos ficam”.

Sempre elogiada por sua coesão de pensamento e atitude diante da arte – na qual se enveredou no começo dos anos 2000, desenvolvendo uma bem-sucedida carreira no teatro -, Grace Passô, agora também diretora (estreou o curta-metragem “Vaga Carne” na mostra, codirigido por Ricardo Alves Jr) disse que sua coerência veio vindo naturalmente ao longo dos anos, tendo começado a partir de premissas que hoje ela questiona. “Eu queria escrever teatro e me preocupava em construir textos para serem publicados. Isso só ficou no desejo, porque o caminho desses textos foi exatamente o contrário”, relembra. “Eu tinha uma noção idealizada do texto teatral, de que talvez, para mostrar a potência e os valores, eu precisa torná-lo independente da cena. Mas o tempo passou e desmistifiquei essa premissa. Depois que você cria uma obra, ela fica maior que você. São voos que a gente não tem a dimensão deles, é de cada um”. Exemplo para muitos realizadores e realizadoras presentes em Tiradentes, Grace protagonizou na mostra o longa-metragem “Temporada”, no qual é dirigida por André Novais, que a chamou de “força da natureza”.

Algumas presenças internacionais em Tiradentes identificaram a vitalidade desse cinema brasileiro independente que não quer se deixar domar e que ocupa as telas com os corpos e o tecido sensível de realidades que circundam diretores, diretoras, atores e atrizes. Para o crítico argentino Roger Koza, essa produção permite que se conheça a fundo o estado de espírito (político e social) do Brasil no momento em que ele é produzido, algo sem equivalência na Argentina. “O cinema ficcional argentino transcorre em outro mundo, em outra dimensão, um mundo de elevação espiritual, mas você não consegue ver como está a Argentina por sua ficção. No cinema brasileiro é diferente, você é capaz de sentir o que se passa no país, e isso pra mim é muito mais potente”, diz.

Esse estado de permanente atenção ao contexto histórico do presente e do passado foi apontado por Lívia de Paiva, de “Tremor Iê”, como um dos estímulos para o filme. O longa foi filmado no início do processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff, e ela e a codiretora Elena Meirelles se perguntaram, diante do resultado, se estavam prevendo algo distópico que viria a acontecer pouco tempo depois. “Não é que antecipamos o que seria do país. Na verdade, os retrocessos já estavam em andamento ali, naquele presente”, afirma Elena. Bruno Ramos, do curta-metragem “Estado de Neblina”, também se disse impregnado da desilusão política no Brasil para chegar à atmosfera de seu filme. “Toda vez que penso na morte da Marielle Franco, eu lembro o motivo pelo qual eu resolvi fazer o filme: para expressar minha sensação de mal-estar, de fim do mundo”, afirma o cineasta.

É por essa teia de gentes tão distintas que os Corpos Adiante se fixam, tanto sob o olhar do espectador de cinema quanto pela visão de todo um país e de um mundo, na inevitabilidade e constatação de suas existências e na luta para que elas permaneçam. Numa semana em que o noticiário nacional se viu tomado de revelações, tragédias e muita lama, a 22a Mostra de Cinema de Tiradentes se integrou à batalha diária desses corpos em movimento, que não querem, não podem e não vão parar. A cultura tem papel imprescindível nesse processo.

SOBRE O EVENTO

22ª MOSTRA DE CINEMA DE TIRADENTES

PLATAFORMA DE LANÇAMENTO DO CINEMA BRASILEIRO

Considerada a maior manifestação do cinema brasileiro contemporâneo em formação, reflexão, exibição e difusão. Busca refletir e debater, em edições anuais, o que há de mais destacado e promissor na nova produção audiovisual brasileira, em longas e curtas, em qualquer gênero e em formato digital. A programação é oferecida gratuitamente ao público e inclui exibição de filmes brasileiros (longas e curtas), pré-estreias, homenagens, debates, encontros com a crítica, o diretor e o público, oficinas, seminário, mostrinha de Cinema, atrações artísticas.

Estão abertas as inscrições de oficinas da Mostra de Cinema de Tiradentes

Estão abertas as inscrições de oficinas da Mostra de Cinema de Tiradentes

Estão abertas as inscrições para as oficinas gratuitas que integram o programa de capacitação e formação da 22ª Mostra de Cinema de Tiradentes, que acontece de 18 a 26 de janeiro de 2019. Os interessados devem ler o regulamento e preencher o formulário disponível no site oficial do evento até 4 de janeiro. Marca esta edição a grande diversidade de abordagens da linguagem e do fazer cinematográfico para as diferentes faixas etárias das oficinas. São 10 modalidades, com oferta de 270 vagas para atender a variados públicos e interesses. Todos os anos, a Mostra Tiradentes oferece formação e capacitação técnica para o mercado de cinema, com oportunidades para a nova geração de atores e realizadores.

“Promover ações de formação é um dos pilares da programação das edições da Mostra de Tiradentes que renova anualmente seu compromisso com o desenvolvimento da indústria audiovisual em Minas Gerais e no Brasil”, ressalta a coordenadora do evento e diretora da Universo Produção, Raquel Hallak.

A principal novidade deste ano é a interação com as novas tecnologias da área, especialmente os smartphones. Oficinas como “Documentários em Vídeo Digital” (para o público adulto), “Cinelabeduca” e “Animando Gente com Pixilation” (ambas para o público infantojuvenil) serão oferecidas pela primeira vez em Tiradentes e propõem ensinar aos alunos estratégias audiovisuais que eles poderão reproduzir depois em casa, com seus celulares.

“Documentários em Vídeo Digital” será ministrada por Lucas Rossi Gervilla e pretende mostrar aos participantes como gravar som e imagem com o máximo de qualidade possível, no contexto imediato e imprevisível do documentário. “Cinelabeduca”, do instrutor Sérgio Roberto Vieira Martins, promete a produção de um filme/vídeo, usando smartphones e aplicativos gratuitos. Já em “Animando Gente com Pixilation”, Rodrigo EBA vai apresentar a crianças e adolescentes técnicas de animação de um jeito lúdico e divertido, com o objetivo de despertar neles o interesse pelo formato.

Destaque também para as oficinas de atuação para diferentes faixas etárias. Os interessados na arte da interpretação terão três opções para descobrir, ou aprimorar, os segredos da performance para a câmera. Na oficina de “Interpretação para Cinema e TV”, com a instrutora Isadora Ferrite, o público adulto vai poder improvisar as histórias escolhidas e decupar as cenas. Já “Dramaturgias do Corpo e Espaço”, ministrada por Marcelo Aquino, pretende oferecer propostas de treinamento, improvisação e composição para intérpretes, transitando na fronteira entre diferentes formas de expressão artística. E “Mergulho nas Cenas – Do Teatro ao Cinema”, comandada por Marizabel Pacheco, vai atender a demanda do público infantojuvenil pela arte de interpretar.

Integram também o Programa de Formação da 22ª Mostra Tiradentes oficinas que irão atender à demanda por profissionalização nas práticas tradicionais do fazer audiovisual. “Direção para Cinema”, ministrada pelo cineasta Luiz Carlos Lacerda, o “Bigode”, vai focar nas noções básicas da mise-en-scène cinematográfica – desde o roteiro e sua decupagem técnica, à construção da linguagem por meio da utilização dramatúrgica das lentes, e o processo de realização. Completam a tríade audiovisual “Prática de Roteiro para Cinema”, em que a instrutora Renata Mizrahi irá apresentar as várias etapas de desenvolvimento do script; e “Produção para Cinema”, ministrada por Alessandra Haro, que vai proporcionar o aperfeiçoamento dos conhecimentos na área.

Por fim, crianças e adolescentes vão poder explorar ainda o universo da produção de retratos com “Fotografia Encenada”, da instrutora Bete Bullara, do Cineduc. Ao final da oficina, será apresentada ao público uma exposição fotográfica digitalizada.

Confira abaixo as oficinas que serão ministradas na 22ª Mostra Tiradentes: 

PÚBLICO ADULTO

DRAMATURGIAS DO CORPO E ESPAÇO

Instrutor: Marcelo Aquino – RJ

Período: 19 a 21 de janeiro de 2019 – sábado a segunda

Horário: 10h às 13h30

Carga horária: 10h30

Número de vagas: 30

Faixa etária: A partir de 18 anos

 

INTERPRETAÇÃO PARA CINEMA E TV

Instrutora: Isadora Ferrite – RJ

Data:  22, 23 e 24 de janeiro de 2019 – terça a quinta-feira

Horário: dia 22, das 14 às 18h e dias 23 e 24 de janeiro, das 14h30 às 17h30

Carga horária: 10h

Número de vagas: 25

Faixa etária: a partir de 18 anos

 

PRÁTICA DE ROTEIRO PARA CINEMA

Instrutora: Renata Mizrahi – RJ

Data:  23 e 24 de janeiro – quarta e quinta-feira

Horário: 9h30 às 13h30

Carga horária: 8h

Número de vagas: 25

Faixa etária: a partir de 18 anos

 

PRODUÇÃO PARA CINEMA

Instrutora: Alessandra Haro – SP

Data:  25 e 26 de janeiro – sexta e sábado

Horário: 10 às 12h30 e 14 às 16h30

Carga horária: 10h

Número de vagas: 25

Faixa etária: a partir de 18 anos

 

DIREÇÃO PARA CINEMA

Instrutor: Luiz Carlos Lacerda – RJ

Período: 23 a 26 de janeiro de 2019 – quarta a sábado

Horário: 23 a 25 de janeiro, de 14 às 17h, e dia 26, de 10 às 13h e de 14h às 17h

Carga horária: 15h

Número de vagas: 30

Faixa etária: a partir de 18 anos

 

DOCUMENTÁRIOS EM VÍDEO DIGITAL

Instrutor: Lucas Rossi Gervilla – SP

Período: 19 a 21 de janeiro de 2019 – sábado a segunda

Horário: 14h30 às 18h30

Carga horária: 12h

Número de vagas: 25

Faixa etária: a partir de 18 anos

 

PÚBLICO JUVENIL

FOTOGRAFIA ENCENADA

Instrutora: Bete Bullara – RJ

Data: 23 a 25 de janeiro – quarta a sexta-feira

Horário: 23 e 24, de 14 às 17h e dia 25, de 14h às 18h

Carga horária: 10h

Número de vagas: 30

Faixa etária: 9 a 13 anos

 

MERGULHO NAS CENAS – DO TEATRO AO CINEMA

Instrutora: Marizabel Pacheco – MG

Data: 23 a 25 de janeiro de 2019 – quarta a sexta-feira

Horário: 10 às 13h

Carga horária: 9h

Número de vagas: 25

Faixa etária: 12 a 15 anos

 

CINELABEDUCA

Instrutor: Sérgio Roberto Vieira Martins – PR

Data: 24 a 25 de janeiro – quinta e sexta-feira

Horário: 10 às 13h

Carga horária: 8h

Número de vagas: 35

Faixa etária: 14 a 18 anos

 

ANIMANDO GENTE COM PIXILATION

Instrutor: Rodrigo EBA! – SP

Data:  23 a 25 de janeiro – quarta a sexta-feira

Horário: 10 às 13h

Carga horária: 9h

Número de vagas: 20

Faixa etária: 14 a 18 anos

 

SOBRE O EVENTO

22ª MOSTRA DE CINEMA DE TIRADENTES

PLATAFORMA DE LANÇAMENTO DO CINEMA BRASILEIRO

Considerada a maior manifestação do cinema brasileiro contemporâneo em formação, reflexão, exibição e difusão. Busca refletir e debater, em edições anuais, o que há de mais destacado e promissor na nova produção audiovisual brasileira, em longas e curtas, em qualquer gênero e em formato digital. A programação é oferecida gratuitamente ao público e inclui exibição de filmes brasileiros (longas e curtas), pré-estreias, homenagens, debates, encontros com a crítica, o diretor e o público, oficinas, seminário, mostrinha de Cinema, atrações artísticas.

TODA PROGRAMAÇÃO É OFERECIDA GRATUITAMENTE AO PÚBLICO.

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Acompanhe a 22ª Mostra de Cinema de Tiradentes e o programa Cinema Sem Fronteiras 2019.

Participe da Campanha #EufaçoaMostra

Na Web: mostratiradentes.com.br

No Twitter: @universoprod

No Facebook: universoproducao / mostratiradentes

No Instagram: @universoproducao

Informações pelo telefone: (31) 3282-2366

 

Serviço

 22ª MOSTRA DE CINEMA DE TIRADENTES | 18 a 26 de janeiro de 2019

 

LEI FEDERAL DE INCENTIVO À CULTURA

LEI ESTADUAL DE INCENTIVO À CULTURA

Patrocínio:  TAESA, FURNAS, CBMM, CEMIG, COPASA|GOVERNO DE MINAS GERAIS

Parceria Cultural: SESC em Minas

Fomento: CODEMGE|GOVERNO DE MINAS GERAIS

Apoio: ACADEMIA INTERNACIONAL DE CINEMA

Incentivo: SECRETARIA DE ESTADO DE CULTURA| MINAS GERAIS

Idealização e realização: UNIVERSO PRODUÇÃO

MINISTÉRIO DA CULTURA – GOVERNO FEDERAL|ORDEM E PROGRESSO

 

LOCAIS DE REALIZAÇÃO DO EVENTO 

Centro Cultural Sesiminas Yves Alves 

Largo das Fôrras

Largo da Rodoviária

Escola Estadual Basílio da Gama