Maratona Oscar: Guerra Fria/ Cesar Augusto Mota

Maratona Oscar: Guerra Fria/ Cesar Augusto Mota

Trazer um belo conto romântico em meio a conflitos sangrentos e perseguições políticas no Velho Continente entre os anos 40 e 60 é, sem dúvida, um grande atrativo para o espectador, ainda mais quando não se trata de um filme político e sim de uma narrativa entre duas pessoas com personalidades e pensamentos tão diferentes. Com o auxílio dessas premissas, o cineasta polonês Pawel Pawlikowski, vencedor do Oscar de melhor filme estrangeiro em 2015 por ‘Ida’, traz ‘Guerra Fria’ (Cold War), uma obra para não só inserir o espectador em um período turbulento e marcante da história como para mostrar que o amor sincero supera tudo, até mesmo a distância.

A narrativa nos apresenta a Wiktor (Tomasz Kot), um compositor responsável por um grupo musical de Folk formado pela Escola de Música polonesa e que irá se apresentar por todo o país, com destaque para a rica cultura nacional. Durante o processo de seleção de talentos, ele conhece e se apaixona por Zula (Joanna Kulig), uma jovem cujo passado é bastante obscuro, com rumores de que teria matado o pai. A trajetória do casal é acompanhada por quinze anos e passa por cidades como Varsóvia, Berlim, Zagreb e Paris, entre várias idas e vindas. Mesmo que já tenham novos parceiros e em meio à repressão política e ao regime comunista polonês, o forte sentimento entre eles persiste, além de uma série de questionamentos acerca de amor e companheirismo surgem durante o desenvolvimento da trama.

O roteiro, assinado pelo próprio Pawlikowski, traz um forte apelo social, além de focar no drama e trabalhar muito bem os cenários. O grupo de artistas, bem como suas apresentações, são muito bem retratados. Os rostos e os ambientes em planos fechados e médios, combinados com uma trilha sonora de músicas clássicas, tornam os momentos inesquecíveis, e a experiência do espectador fica ainda mais vibrante quando é feito um cruzamento com o conturbado momento de repressão pós-Segunda Guerra e o romance improvável e difícil entre Viktor e Zula. A projeção em preto e branco aliada a cortes rápidos ajuda o públi co a perceber as cenas com muito mais detalhes e a captar melhor as expressões faciais e os sentimentos dos personagens, uma experiência diferente se o filme fosse ilustrado em cores.

A trama e as ações que se desenrolam são interessantes na primeira metade do filme, porém, há cortes abruptos e uma aceleração no tempo do segundo para o último ato, prejudicando o ritmo e a conclusão da história. Questões ideológicas não são abordadas e as visões de mundo dos dois protagonistas não são muito claras, o que poderia deixar a narrativa mais rica. Mas, mesmo que a política não seja o centro das atenções, a narrativa é dotada de uma grande beleza estética, com uma fotografia em preto e branco primorosa e atuações sensíveis e vibrantes de ambos os intérpretes. Joanna Kulig (João e Maria: Caçadores de Bruxas) demonstra uma personagem segura e decidida sobre o que quer da vida, ainda mais quando começa a deslanchar no mundo da música, já Tomasz Kot (A Arte de Amar) dá vida a um autêntico boêmio, amante da noite e da liberdade, mas que passa por grandes transformações quando precisa se deslocar de país para não ser surpreendido e preso e também quando é confrontado por Zula no que tange à sinceridade e o amor que os cerca. Ambos os atores apresentam expressões fortes e convincentes, ganhando a empatia da plateia, com papeis complexos e transmi tindo veracidade em suas emoções.

O trabalho de Pawel Pawlikowski é admirável e mereceu a indicação ao Oscar de melhor diretor, além de ser lembrado nas categorias de melhor fotografia e melhor filme estrangeiro. O público se depara com um filme que faz uma boa variação entre romance e drama, possui uma trilha sonora impecável, dotado de uma bela fotografia e uma história com importante registro histórico de um dos períodos mais sangrentos e controversos da humanidade. Há um perfeito paralelo entre o belo e o caótico, num perfeito clima intimista e uma história cheia de ingredientes, com amor, intrigas e muita música. Não seria exagero se ‘Guerra Fria& rsquo; levasse algum prêmio do Oscar para casa, tanto pelo primor da abordagem de seu diretor quanto pela excelência de recursos técnicos empregados, uma obra de se encher os olhos.

Cotação: 4/5 poltronas.

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