Poltrona Cabine: Corpo e Alma/ Cesar Augusto Mota

Poltrona Cabine: Corpo e Alma/ Cesar Augusto Mota

Sem dúvida os filmes românticos estão entre as preferências dos cinéfilos, ainda mais quando os protagonistas são carismáticos. Mas o que você diria de um filme cujos personagens centrais não são tão afetivos assim, marcados pela melancolia e possuem uma forte ligação onírica? Prepare-se, pois o longa húngaro ‘Corpo e Alma’, da cineasta Ildikó Enyedi, vai inicialmente causar estranheza, mas depois apresentar sequências tranquilas e conquistar o público.

Inicialmente, nos ambientamos em um abatedouro de gado, um local um tanto perturbador e sinistro, e lá trabalha Endre (Morcsányi Géza), diretor financeiro. Ele tem poucos amigos e está com o braço esquerdo debilitado, sem movimentos, e com medo de ter novos relacionamentos após algumas decepções amorosas. Logo em seguida, chega Mária (Alexandra Borbély) para trabalhar como inspetora de qualidade, uma mulher bastante estranha, com traços pálidos, sem o desejo de se aproximar de outras pessoas e com incômodo apenas por tocar nos outros. Um ambiente um pouco pesado, composto por duas pessoas deslocadas do seio social e que não reúnem os estereótipos predominantes na sociedade moderna.

O roteiro dá um tratamento onírico à história, depois vai para o universo lúdico. Os dois protagonistas são apáticos, avessos ao convívio social e sofrem de sérios traumas, mas ambos possuem a habilidade de ter os mesmos sonhos, além de poderem se encontrar neles, mas na forma de animais. Ele é um veado, ela, uma cerva, e se deparam em uma floresta congelada e cheia de neve. Mária e Endre não estão preocupados com padrões sociais e relacionamentos quando sonham, mas quando acordam se deparam com uma tarefa árdua e perturbadora, o mundo real, cheio de amarras e desconfortável para eles. Ambos tentam se aproximar e se apaixonar, e a sequência de ações praticadas por eles deixam isso mais evidente. Tratam-se de formas de libertação que encontram em um universo tão complexo e desconfortável.

No tocante à fotografia, o espectador se depara com belos planos estéticos nos sonhos de Mára e Endre, e tons pastéis e fortes no ambiente do matadouro, um conflito feito de forma proposital para que o público se encante com o mundo fantasioso e se importe mais com os personagens centrais, o que acaba acontecendo na maior parte do tempo. Porém, o nível cai no terço final da trama, mas nada que prejudique a qualidade imagética da obra, mais forte que os propriamente os diálogos da trama.

Se não é um filme tradicional, com bonitos ambientes, jantar à luz de velas e personagens carismáticos, ‘Corpo e Alma’ se preocupa em trazer ao público uma história capaz de ligar realidade e fantasia e focar nos conflitos internos de seus personagens, bem como trazer artifícios e alternativas para esses entreveros. Sensível, alegórico e impressionante, não foi à toa que o longa de Ildikó Enyedi levou o Urso de Ouro no Festival de Berlim. Uma perfeita obra que traz temas importantes, como as relações imperfeitas entre humanos, o direito dos animais e o principal, a possibilidade de uma relação amorosa existir em um ambiente improvável, um matadouro.

Avaliação: 4,5/5 poltronas.

 

 

Por: Cesar Augusto Mota

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