Você muito provavelmente já ouviu falar da “cena da sorveteria.” Fernanda Torres, com um olhar tão impactante quanto difícil de se descrever, observa casais felizes em uma sorveteria. Ela interpreta Eunice Paiva em um estabelecimento que costumava frequentar com a família e o marido, Rubens Paiva (Selton Mello), morto pela ditadura militar.
Sim, é muito impactante, e possivelmente a melhor da carreira de Torres. Ela mereceria um Oscar só por isso.
Você muito provavelmente já ouviu falar da cena em que Rubens Paiva olha para Eunice e fala que já volta, ao ser levado de casa pelos agentes do regime. Os dois trocam olhares, e ele não volta mais.
Sim, é muito impactante, e um dos melhores momentos de Mello no longa. Fernanda está brilhante, mas a performance de Selton como coadjuvante, diga-se de passagem, também merece todos os elogios.
Você muito provavelmente já ouviu falar da cena em que o cachorro da família é atropelado e Eunice atravessa a rua e bate no vidro do carro dos agentes da ditadura, clamando por saber o paradeiro de seu marido. Das cenas das reuniões da família. Da participação da Fernanda Montenegro no final. Da música do Eramos Carlos. Da vida de Eunice e Rubens Paiva. Do livro de Marcelo Rubens Paiva. Dos vários prêmios.
A esta altura, você muito provavelmente já ouviu falar de praticamente tudo que envolve “Ainda Estou Aqui”, longa de Walter Salles que concorre a três estatuetas no Oscar deste ano — melhor filme, melhor filme internacional e melhor atriz (Torres). Eu não posso fingir que não. O filme é um mega hit no Brasil, e um grande sucesso internacional, alavancado pela vitória de Fernanda no Globo de Ouro.
Mas ainda que você provavelmente já tenha ouvido falar de todas elas, há coisas das quais não podemos deixar de mencionar nunca. A ditadura militar é uma delas. A memória de um país e de um povo, já tantas vezes retratada no cinema e que mais tantas será. E a partir de agora “Ainda Estou Aqui” também é uma delas, e espero que servindo para alavancar essas produções futuras.
Ele é um grande marco para o cinema brasileiro. Em minha vida como fã nascido quase junto a “Central do Brasil”, talvez a melhor referência prévia, jamais havia visto tamanha mobilização em torno de um filme nacional. E sabe o que é melhor? É muito merecido. Salles faz uma obra com pesquisa redonda e atores em um momento brilhante. A fotografia é linda e cuidadosa. A trilha sonora é genial.
Você muito provavelmente já ouviu incontáveis elogios para “Ainda Estou Aqui”. Sim, todos eles são justos e neste humilde espaço os ecoo. Você muito provavelmente já até assistiu “Ainda Estou Aqui”. E se não o fez, por favor, nem termine de ler este post com meus prognósticos e vá correndo procurar um jeito de vê-lo.
Creio que há grandes chances de vitória na categoria de melhor filme internacional, especialmente após as polêmicas de “Emilia Pérez”. Em melhor filme é mais difícil. Fernanda Torres está muito competitiva na categoria de melhor atriz. Demi Moore (“A Substância”) levou SAG e o outro Globo de Ouro. O cenário está embolado entre as duas, mas hoje vejo leve vantagem para a americana.
Você muito provavelmente já ouviu milhares de “boa sorte ao Brasil” na sua vida. Mas sim, deixo aqui o meu também. Boa sorte, “Ainda Estou Aqui”!
Nota da editora: Ainda Estou Aqui concorre a três Oscars: Melhor Filme, Melhor Atriz para Fernanda Torres e Melhor Filme Internacional.

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